segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Melancholia (2011)

“A Terra é má. Ninguém vai sentir falta dela.”- Justine.

Melancolia. O sentimento de tristeza conhecido por uma vasta maioria de seres humanos, é uma das faces da depressão de Lars von Trier, o fantasma pessoal mais recentemente visitado pelo diretor não só em seu último filme como também em seu trabalho anterior, Anticristo, este talvez o mais hipnotizante pesadelo cuja projeção eu tive a oportunidade de contemplar.

Diferentemente do filme de 2009 também estrelado por Charlotte Gainsgbourg, em Melancolia a agressividade abre espaço para a apatia. É plena a ausência de reação e vontade que toma conta de Justine (Kirsten Dunst) no dia de seu casamento e cabe a Claire o papel de cuidar da irmã deprimida e de forma magnética, tentar atraí-la para a realidade bonita de uma cerimônia dos sonhos realizada num bucólico Château europeu. Obviamente o esforço da irmã mais velha se mostra inútil. Não há panacéia para o mal interno que devora Justine, tanto quanto não há como evitar a ameaça exterior do Melancolia, planeta que a cada instante se aproxima da Terra, definindo uma rota cujo ponto final implica na destruição de toda vida terrestre.

Pouco há de convencional nos filmes do diretor dinamarquês. Seus personagens ainda que presos a uma pele aparentemente frágil, pintam e bordam diante das situações e demonstram todo seu desprezo pelas convenções sociais. Até certo ponto, é isto o que move Justine na primeira parte do filme, embora claramente não o faça de maneira ativista, com o anseio de colocar abaixo os castelos de areia das relações humanas, mas apenas pela honesta tentativa de ainda sentir algo que a tire de sua inércia, seja raiva ou desejo, porque qualquer coisa parecida com alegria seria pedir demais. É esse sentimento de falta de pulso que faz a platéia temer tanto uma identificação. Afinal, o que pode ser mais assustador que perder todo e qualquer interesse pela vida?

Assumidamente um admirador dos mestres Andrei Tarkovski e Ingmar Bergman, Lars von Trier faz de Melancolia um monumento de referência aos dois diretores. O primeiro através da forma do filme, na beleza das imagens criadas por von Trier. A câmera lenta, leve, captando um movimento quadro-a-quadro de maneira admirável, bem à moda do diretor russo. Já a presença bergmaniana pode ser sentida através do conteúdo cinematográfico, na medida em que a relação entre Justine e Claire remete o cinéfilo a Persona (1966) em que as personagens de Liv Ullmann e Bibi Andersson trocam de personalidade.

Com a certeza do fim implacável, depois de muito lutar para tentar proteger o filho da morte, Claire se entrega e convida a irmã para tomar uma bebida no terraço enquanto esperam a morte inevitável. A reação instantânea que Justine esboça em seu rosto ilustra bem o sentimento que me tomou ao final da projeção. Afinal, se a vida na Terra é má e sua falta não será sentida, então não há porque se lamentar ou buscar camuflar o terror tomando drinques na sacada do suntuoso castelo, cujos muros são incapazes de proteger seus habitantes do apocalipse anunciado.

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